quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

Sonhos Vermelhos


"Andava por uma trilha onde havia sonhos vermelhos enganchados nos galhos da mata, talvez deixados por alguma moça que por ali passara ao retornar da passagem incrustada na pedra, passagem essa que levava para o além-não-há-mundo.

Fingia tocar silhuetas de prata, achar-se mais valiosa ao surdo toque na imagem de Dor pintada pela luz, filtrada pelos estilhaços de sonhos vermelhos, ficando a luz também vermelha e cega (ou preta).

...os pássaros cantavam uma canção de noite!

Os sonhos deviam ter luz própria.

Ou alguém tinha olhos de coruja.

Ou ouvidos de morcego para ouvir tanto ao ponto de ouvir um sonho que nem foi contado; um sonho vermelho, não filho da cor, o destino a guiar-lhe, e o horizonte nem aí para o destino!... O horizonte não liga para o futuro, mas o futuro liga para as horas de ontem, filho de ontem que ele é. É? Deve ser. Pelo menos, disseram que era por volta da meia-noite que foi vista uma moça de óculos de grau alto, tocando nas copas das árvores para ver se alcançava aqueles sonhos, encardidos, mais para laranja...

Dizem ainda que ela cortou os pulsos para retocar a cor dos sonhos, morreu branca, sem um pingo de realidade, pelo menos dessa realidadezinha dessa cidadezinha. “Coitada!”, disse a velha. “Que porra é isso?!”, disse o jovem ignorante; mas nem todo jovem é ignorante mas nem todo mundo sabe disso, principalmente os pais que ficam trepando enquanto a filha sai para trepar na festa da amiga. Olhe que ela era adolescente!

Bem diferente da moça da trilha de sonhos vermelhos; essa sim valia a pena dar um salto num abismo só para trazer prazer para ela ao ver meu corpo se espatifar em lugar nenhum à sua vista, pelo menos. Por isso e outros ela era feliz! Eu também era feliz, porém, não vem ao caso nem ao acaso, quer dizer. Ela era feliz. Porém: virou pó. Rendeu mais que aquela que foi para a casa da amiguinha... a amiguinha era lésbica e a amava! A amiguinha sumiu faz três dias disseram faz três meses dirão faz três anos apenas para dar ibope.

A moça do sonho da trilha vermelha faz o mesmo tempo o seu sumiço. Então, a amiguinha é a moça; e os sonhos vermelhos, pedaços da filha. A amiguinha de uma faca de ciúme a matara. E ciúme tem dessas coisas. O amor é lindo e produz horrores de ódio. O ódio é grotesco e mora numa caverna como aqueles morcegos ouvidores de cores.

Desde quando morcegos ouvem cores? Não sei. Só sei que é interessante para o estilo desse alguma coisa conto policial alguma coisa conto prosa poética um pouco de linguagem arrevesada para se satisfazer ao gosto esteta, tão gramático, tão furibundo com absurdos literários sentadinhos em suas poltronas cor bege dizendo que o mundo está uma porcaria sem nada fazer."

(Wanilson Pereira)


Eis uma "prosa poética" como ele, Wanilson Pereira, gosta de chamar as prosas que escreve. É um menino de coração latente de emoções, palavras bem colocadas, tem a poesia exalada pelos poros. Meu grande companheiro nas madrugadas de insônia pelo msn. Figura notável no último Enel (2007) em Curitiba, onde nos conhecemos. Não é à toa sua predileção por Nietzsche: suas palavras, assim como as de Zaratustra, não são para quaisquer ouvidos....

Divido com vocês um desses textos maravilhosos que ele escreve.

Um beijo!





3 comentários:

denker disse...

Muito bom o escrito!!

a pessoa tem talento!
parabens!!

http://pensandoentreamigos.blogspot.com/

Andréia Silva disse...

Belíssimo. Um beijo pra vc. Obrigada pelos comentários, todos lindos e bem vindos. Boa sexta!

Lalo Oliveira disse...

O texto certamente não é para qualquer ouvido, mas acho um tanto de exagero compará-lo com Frederich Wilhelm. rsrsrs

Eu particularmente aprecio 'prosa poética', o mesmo não acontece com 'poesia prosada'.

Beijos...